Postado em: 10/03/10 às 19:58:46 por: James
Categoria: Marisa Bueloni
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(Marisa Bueloni)
Então, ela se deu conta:
a vida só lhe trouxera sofrimento,
desgosto, lamento,
cansaço e maltrato.
Para quem ansiava pela glória,
contava a si mesma
a prosaica história
do anonimato.
Quem precisa de glória, afinal?
Na pensão pobre – um respeitável teto –
tinha por companhia e carinho
um gato rejeitado e magrinho,
à guisa de afeto.
Lavar a transformação da face
na água fria da torneira a cada manhã,
encolher-se sob o velho cobertor na cama vasta.
Para quem amava viver,
alimentava a ilusão de que na vida
a própria ilusão da vida basta.
Um caderno grosso
- ah, velho amigo! –
lotado de poesias escritas pelos rodapés e margens,
era seu guardado mais antigo.
Para quem idealizou a sorte
da imortalidade,
restava a certeza de encontrarem seus versos
após sua morte,
íntimo legado à posteridade.
Avental puído, esperança gasta,
partiu desta vida ingrata,
não deixou ouro nem prata,
era um anjo etéreo.
Sem atrativos e sem sucesso,
sem nunca ter cometido o menor excesso,
penando na terra as anemias,
brandiu seu espírito no céu
à procura de melhores dias.
Deus surgiu no patamar da entrada celestial
e abraçou-a de um jeito especial,
dizendo: “Entra, aqui tua glória será eterna,
és bem-vinda,
terás um pódio para cada perna.
Escreveste em silêncio a anônima dor,
aquela que honra o Meu amor
e receberás o prêmio eterno.
Aqui todos te conhecem, amada,
publicou-se no céu o teu caderno”.