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Artigo N.º 6249 - Atualidade do pensamento de São Tomás de Aquino
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Postado em: 24/09/10 às 11:26:10 por: James
Categoria: Artigos
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Como situar o tomismo no contexto atual? Se o Doutor Angélico vivesse hoje, o que acrescentaria à sua obra? Para a filosofia dele, existe uma "via da beleza"? O padre Mauro Mantovani, SDB, decano da Faculdade de Filosofia do "Salesianum", de Roma, responde a estas e a outras questões.

Entrevista com o vice-reitor da Università Pontificia Salesiana

 

Como se deu sua identificação com o carisma salesiano, levando-o a tornar-se um filho de Dom Bosco?

Encontrei os salesianos e os conheci cada vez melhor na minha paróquia em Moncalieri, onde nasci, porque os estudantes salesianos de teologia do centro de estudos turinense da "Cruzinha" vinham ajudar nosso pároco, aos sábados e domingos, nas atividades pastorais.

Eu tinha 17 anos e o contato com eles suscitou em mim o crescente desejo de empenhar o melhor de minhas energias e de minha juventude no serviço dos jovens, primeiro no oratório e depois também nas atividades externas, descobrindo aos poucos - graças inclusive ao acompanhamento espiritual, à oração e à vida sacramental, e ao crescente contato com a palavra de Deus - a beleza da experiência de viver até o fundo a própria Fé.

No decurso dos anos seguintes e, depois, nos da formação salesiana, procurei aprofundar cada vez mais o sentido do chamado a ser - como afirma nossa Regra de vida - um sinal e um testemunho do amor de Deus aos jovens, sobretudo os mais pobres. Concretamente, isso se configurou sempre mais como serviço à formação espiritual e cultural dos jovens, de modo especial os universitários, tanto religiosos quanto leigos.

Em que o estudo da obra de São Tomás de Aquino ajudou-o a crescer e se aprofundar na via salesiana?

Entrei pouco a pouco nos estudos sobre São Tomás de Aquino, levado, sobretudo, pela importância a ele atribuída em alguns dos cursos filosóficos fundamentais que segui na Universidade onde agora leciono. O que logo me impressionou foi o fato de, à medida que aprofundava o conhecimento nesses estudos, dar-me conta da grande significação e atualidade do seu pensamento; não porque se deva repetir hoje seu conteúdo de maneira acrítica e ininterrupta, com o risco de fazer apenas "arqueologia" fora do contexto, mas, ao contrário, especialmente pelo estímulo a fazer do próprio estudo sério um serviço cultural, pela utilização - por parte do Doutor Angélico - do método filosófico realista, pela abordagem positiva e dialogal com outras tradições religiosas e culturais, pela profundidade de algumas argumentações fundamentais, quer de cunho metafísico quer antropológico.

O ponto particular que assinalo, inclusive porque pode ser resumitivo de vários outros elementos, está propriamente naquela harmonia entre fé e razão, que a própria encíclica Fides et ratio lhe reconhece.

Como situar o pensamento de São Tomás de Aquino num mundo marcado pelo espírito materialista, consumista e voltado para o imediato?

Respondendo diretamente à pergunta, sem entrar no mérito das considerações sociológicas a respeito da situação contemporânea, parece-me poder dizer que o tomismo - empregando este termo numa acepção ampla e geral - pode fornecer hoje um importante contributo cultural também a este respeito. Com efeito, ele defende e valoriza de modo autêntico a dimensão terrena e material das realidades criadas, acrescentando, porém, a necessidade de lhes atribuir o justo valor, de colocá-las no seu devido lugar, segundo uma ordem que está sempre à disposição do sujeito e de sua consciência, mas que, em si, não é subjetiva, e sim objetiva.

Em certos segmentos da sociedade encontra-se uma sede do metafísico que produz grande vivacidade intelectual. O senhor é desta opinião?

Concordo quanto à existência desses "fermentos culturais" que demonstram grande vivacidade intelectual: naquilo em que não são preconceituais ou autorreferenciais e mostram-se abertos à dimensão mais autêntica da procura da verdade, dado existencial que acompanha todo homem, abrem-se efetivamente novos espaços, até agora inexplorados, para o encaminhamento na direção da Transcendência.

De resto, já superamos dentro do próprio debate epistemológico uma visão reducionista de ciência - embora, infelizmente, algumas formas de reducionismo continuem a dominar os horizontes de certa cultura que invoca a abertura, mas se mostra, ela mesma, ainda bastante fechada -, assim como fica evidente também que quem continua a sustentar a existência da "crise da metafísica" não percebe que as questões atualmente mais vivas no debate cultural (a bioética, o respeito ao meio ambiente, as neurociências, para mencionar apenas algumas) não fazem outra coisa senão remeter a temas metafísicos e antropológicos fundamentais.

Se São Tomás vivesse hoje, o que acrescentaria à sua obra?

Certamente o Doutor Angélico não hesitaria em enfrentar hoje os novos temas e não recuaria ante as quæstiones disputatæ que lhe fossem apresentadas pelos seus eventuais alunos. Procederia, com certeza, evitando a superficialidade e a improvisação, provavelmente não se apresentando com frequência na mídia ou nos programas de entrevista para abordar todo tipo de assunto, mas estudando, antes, a fundo cada autor e interlocutor, e evidenciando todo aspecto apreciável - pelo seu conteúdo de verdade - inclusive das perspectivas mais afastadas da sua, e fazendo o esforço crítico de discernir entre o que nelas se encontra de complementar, integrativo e harmonizável com a sua, e aquilo que, pelo contrário, mostra-se simplesmente inconciliável.

Embora hoje tenha aumentado a justo título a atenção aos comentários escriturísticos do Doutor Angélico, colhendo-se neles inclusive seu significado metafísico e antropológico, na minha opinião o Aquinate nos apresentaria ainda hoje o seu De ente et essentia como texto que, mesmo brevemente, contém a chave fundamental para a compreensão do seu enfoque metafísico e da sua originalidade, que - mesmo com diferenças relevantes na sua interpretação por parte dos comentadores, tanto clássicos como modernos - foi justamente identificada com a doutrina da distinção real, nas criaturas, do ato de ser e da essência, e da relativa indicação filosófica do Absoluto como o Ipsum Esse Subsitens.

Num estudo recente, procurei demonstrar, por exemplo, como se poderia assinalar uma ligação direta entre a impostação metafísica presente no De ente et essentia e as características próprias das assim chamadas "cinco vias" presentes na Suma Teológica (I, q.II, a.3).

Sob o ponto de vista da ética, parece-me também significativo ressaltar como a reflexão moral do Doutor Angélico está hoje em condições de suscitar particular interesse, por ser capaz de aprofundar e de desenvolver de modo muito adequado a relação entre os conceitos de felicidade, de vida reta e de virtude, fundamentando em última análise uma ética da "primeira pessoa", como demonstram, entre outros, vários estudos do Prof. Giuseppe Abbà, docente de filosofia moral na Faculdade de Filosofia Salesiana de Roma, que me alegro de ter como amigo e colega. Viver e trabalhar em Roma representa, com efeito, uma ocasião única de enriquecimento também para aqueles que se interessam pelos estudos tomistas, tendo a possibilidade de interagir frequentemente com colegas e pesquisadores da Pontifícia Universidade São Tomás de Aquino (Angelicum) e de outras universidades, sobretudo pontifícias e, além disso, com vários membros da Pontifícia Academia São Tomás e da Sociedade Internacional Tomás de Aquino. Ainda nos últimos anos não faltaram atividades comuns, de grande interesse científico e de ampla divulgação.

Como o pensamento tomista vê a experiência estética enquanto um caminho rumo ao Absoluto? Existe uma "via da beleza"?

O tema da beleza é particularmente significativo e sugestivo hoje, porque, dentro de uma situação cultural que parece mostrar-se menos sensível e atenta à dimensão transcendental (portanto, objetiva) da verdade e da bondade, a experiência estética e o encontro com tudo quanto é caracterizado pela beleza e sublimidade, sejam elas naturais ou artísticas, representam em várias ocasiões uma "via" privilegiada para elevar as próprias considerações, abrir-se à dimensão transcendente da existência e encaminhar-se rumo Àquele que é o "sumamente Belo". Nesse sentido são muito interessantes os episódios biográficos daqueles que alcançaram uma abertura para o Absoluto a partir - ou por meio - de uma forte experiência estética, por exemplo, a musical. Basta pensar em intelectuais como Paul Claudel ou Gabriel García Morente.

Quanto à pergunta se existe uma específica "via da beleza", eu responderia que, na medida em que o pulchrum é reconhecido como um transcendental do ser - como fica evidente na Suma Teológica (I, q.5, a.4), onde Tomás de Aquino afirma que "pulchrum et bonum in subiecto sunt idem, sed ratione differunt" -, a via pulchritudinis pode tornar-se transitável. Não, entretanto, como uma via ulterior e específica, mas segundo aquela mesma perspectiva da quarta via, ou seja, ex gradibus perfectionis. Por tal perspectiva, depois de haver-se individuado e reconhecido ao menos algumas perfeições, pode-se também afirmar que elas não encontram a razão última de sua "distribuição" nos graus diversos das realidades criadas senão remontando à afirmação da existência daquela Realidade que possui essa perfeição no seu sumo grau, ou melhor, é a própria perfeição subsistente, identificando-se com o Ipsum Esse Subsistens.

O filósofo tomista padre Battista Mondin escreveu acertadamente que "permanecemos extasiados na presença da beleza. A beleza olha-se, fixa-se, contempla-se, escuta-se silenciosamente. A beleza se apodera de todo o nosso ser. Um belo sol no oceano, o panorama dos Alpes, a Capela Sistina, o espetáculo de um bom filme ou de uma obra musical... nos arrebatam de tal forma que gostaríamos que nunca terminasse. Há na beleza algo de prodigioso, extraordinário, sublime, sobrenatural que não pode provir da matéria. Por isso filósofos, teólogos e poetas viram na beleza uma perfeição divina".

O presidente do Pontifício Conselho para a Cultura, Dom Gianfranco Ravasi, criou recentemente uma fundação para promover o encontro da Igreja com os não crentes e agnósticos. Poderia nos indicar outros projetos orientados ao diálogo entre Religião e Ciência?

As atividades do Pontifício Conselho para a Cultura e as iniciativas tomadas por Dom Gianfranco, que o senhor menciona, representam uma experiência muito profícua de diálogo entre a Igreja e a cultura contemporânea, quer na sua caracterização puramente científica, quer na diretamente humanística, na qual a arte tem um espaço muito importante e privilegiado.

Entre os mais frutuosos exemplos de diálogo entre ciência e religião, propriamente na perspectiva de promover um renovado encontro e colaboração entre a "cultura científica" e a "humanística", encontra-se sem dúvida o Projeto STOQ (Science, Theology and the Ontological Quest), do qual tenho a honra e a alegria de participar como Coordenador e representante da Pontifícia Universidade Salesiana.

Este projeto, lançado nos primeiros anos do terceiro milênio graças à coordenação e ao apoio do Pontifício Conselho para a Cultura, abarca, junto com a nossa, sete outras universidades pontifícias romanas, como a Lateranense, a Gregoriana, o Ateneo Regina Apostolorum, a Santa Cruz e a São Tomás de Aquino, com a fundamental sustentação da John Templeton Foundation.

O contributo específico da Pontifícia Universidade Salesiana ao Projeto STOQ está voltado - em relação à identidade cultural, eclesial e carismática da nossa instituição acadêmica - para a consideração do âmbito educativo como lugar particularmente significativo de encontro entre religião, ciências humanas e ciências naturais, reconhecendo um espaço importante, no âmbito epistemológico e interdisciplinar, ao papel e à mediação da filosofia.

Além de pesquisas e congressos, convites a docentes de fama internacional para aulas ou conferências e colaboração com outras universidades no campo da relação entre teologia, filosofia e disciplinas científicas, já realizamos duas publicações: Fé, Cultura e Ciência - Disciplinas em diálogo (em conjunto com M. Amerise, Libreria Editrice Vaticana, 2008) e Didática das ciências - Temas, experiências, perspectivas (em conjunto com C. Desbouts, Libreria Editrice Vaticana, 2010). No total, foram editados até agora nove volumes da STOQ Project Research Series.

Gostaria de concluir com uma citação do nosso pranteado Dom Carlo Chenis, secretário da Pontifícia Comissão para os Bens Culturais da Igreja, Bispo de Civitavecchia- Tarquinia e docente de Estética durante mais de 25 anos na Pontifícia Universidade Salesiana, que nos deixou prematuramente em 19 de março de 2010: "Diz-se Deus com a palavra, com a imagem, com o silêncio. Envolve-se Deus nas palavras humanas, que se tornam mágicas, ou anuncia-se Sua inefável presença mediante oráculos e profecias. ‘Dizer Deus é o mais significativo empenho do existir humano, pois é também ‘dizer o próprio eu chegando ao fim da vida. Em comparação com Ele, discursos e imagens são totalmente inadequados e ao mesmo tempo são símbolos dEle. A aventura de ‘dizer Deus repropõe o diário de toda a humanidade, cujas páginas são manuscritas com incerteza ou com segurança, com tumulto ou com serenidade, com exultação ou com angústia, com desespero ou com felicidade".

 

Nascido em Moncalieri (Turim), no ano de 1966, Pe. Mauro Mantovani é Vice-reitor da Pontifícia Universidade Salesiana, de Roma, e Decano da sua Faculdade de Filosofia. Desde 1986 pertence à Congregação Salesiana. Foi ordenado sacerdote em 1994 e obteve o Doutorado em Filosofia (eclesiástico e civil) na Pontifícia Universidade de Salamanca, Espanha. É membro da Pontifícia Academia São Tomás de Aquino e conselheiro da Sociedade Internacional Tomás de Aquino.

 


www.arautos.org



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